10/09/2025 - O Globo
Por João Vitor Costa — Rio de Janeiro
Dados de relatório da ANPTrilhos mostram aumento de 18% na quantidade de passageiros no primeiro semestre de 2025 em comparação com o mesmo período de 2024; perfil dos usuários mudou.
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Fim do home office 'puro' pode ter influenciado no aumento da demanda do VLT no Centro do Rio
Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
Hora do almoço de uma quinta-feira na esquina da Rua Sete de Setembro com a Avenida Rio Branco. O "bléin bléin" do VLT ressoa no cruzamento movimentado para alertar sobre a aproximação do trem, que para cheio na estação mais próxima, a Colombo. A cena se soma a outras que sinalizam a gradativa retomada do Centro e da Zona Portuária do Rio, da qual os bondes modernos que atravessam a região também se beneficiam. Relatório da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) divulgado nesta quarta-feira revela que o VLT carioca registrou um aumento de 17,2% na quantidade de passageiros no primeiro semestre de 2025 em comparação com o mesmo período de 2024. Foram aproximadamente 13 milhões de usuários de janeiro a junho deste ano, contra cerca de 11 milhões nos seis primeiros meses do ano passado.
O burburinho que aos poucos volta ao antigo coração financeiro do Rio, no entanto, é só uma das explicações para o crescimento. O estudo na ANPTrilhos atribui o fenômeno à inauguração, em fevereiro do ano passado, do Terminal Gentileza, aonde chegam duas linhas do VLT, seis linhas do BRT vindas da Zona Norte e outros 17 serviços de ônibus, oriundos de todas as regiões da cidade. E cita ainda a entrada em operação plena da Linha Laranja (uma das quatro atuais no VLT), que liga o Gentileza à Praça Quinze, passando pela Central do Brasil e pela área de comércio popular da Saara.
— Aumentou muito o número de pessoas, e percebo uma mudança do perfil dos passageiros. No início, tinha mais turista. Hoje, vejo todo mundo — observa a secretária Ivone Gomes, que mora em Paquetá e usa o VLT entre a barca e o escritório em que bate seu ponto, no Centro.
Viajando nas composições, o que se vê é mais gente de uniforme, paletó, terninhos, salto alto e sapatos sociais, o dress code de muitos dos postos de trabalho da região. Acessórios como mochilas, pochetes e pastas reforçam que muitos estão ali a caminho do emprego ou dos estudos. É um vaivém que em nada lembra o limbo do período da pandemia da Covid-19, que acelerou o esvaziamento do Centro. Na época, o VLT chegou a perder cerca da metade de seus passageiros, com queda de aproximadamente 23 milhões de usuários ao longo de todo o ano de 2019 para cerca de 12 milhões em 2020.
Hoje, iniciativas como o Reviver Centro (para incentivar moradias na região), buscam reverter esse quadro. Paralelamente, uma nova mudança na forma de trabalho pode colaborar para a retomada. Claudio Guimarães, conselheiro da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-RJ), observa que, nos últimos tempos, o home office “puro” diminuiu e as pessoas voltaram aos escritórios. Com isso, o trabalho híbrido aumenta o fluxo de pessoas transitando pelo bairro nos dias de pico, especialmente terça, quarta e quinta-feira.
— Vou ser franco, na hora do rush, o VLT não está dando vazão — observa o chefe de manutenção Sidnei Viana, de 69 anos, passageiro que também elogia o modal de transporte. — Sou da antiga, e o VLT é bem melhor que o ônibus. Um trajeto da Central até a Sete de Setembro, que levava 30 minutos, hoje dura cinco.
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Composição do VLT, modal que impulsionou aumento no número de passageiros sobre trilhos no Rio, com grande demanda — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
As estações que registraram maior aumento de demanda no primeiro semestre de 2025, aponta a concessionária que administra o VLT, foram Terminal Gentileza (110%), São Bento (34%), Cristiano Ottoni (12%) e Colombo (18%). Diretora do VLT Carioca, Silvia Bressan afirma que a equipe técnica avalia a demanda semanalmente, para realizar ajustes. Ela enumera medidas tomadas na operação com o aumento da demanda:
— A redução do intervalo nos trechos compartilhados (como na Avenida Rio Branco), de quatro, para 3,5 minutos, e o ajuste da linha 1, que passou a operar com intervalos médios de sete minutos. Antes, eram oito minutos.
Grandes eventos e o porto
A concessionária lembra que, para além de quem vai para o trabalho, o VLT continua sendo usado por turistas, que acessam o modal em direção à Rodoviária Novo Rio, ao Aeroporto Santos Dumont e a estações de metrô. Durante o carnaval, os megablocos e os desfiles na Sapucaí também motivaram grande procura do sistema.
Outro fator que pode estimular o fluxo de passageiros é a revitalização da região portuária. Além de museus e eventos realizados no entorno da Praça Mauá, incluindo espaços como o Armazém da Utopia, prédios erguidos no Porto Maravilha já têm seus primeiros moradores. Uma delas é Sandra Lima, criadora do canal no YouTube “Porto Maravilha RJ”, que mostra as obras dos empreendimentos, além dar dicas culturais e gastronômicas do entorno.
— Apesar de termos carro, meu marido usa o VLT até o Centro, porque é mais prático. Eu também, para ir para todos os lados — conta Sandra.
Novos moradores começam a chegar
Leonardo Mesquita, vice-presidente de Negócios da Cury, empresa responsável por 18 empreendimentos na região, conta que atualmente há cerca de 2.500 pessoas morando nos novos condomínios da construtora. Presencialmente, ainda há uma média de 300 corretores trabalhando por dia, que se juntam a outros 500 funcionários. Pelos próximos três anos, 10.400 unidades serão entregues.
— O VLT é talvez o maior atrativo, porque em 70% dessas unidades não há vaga de garagem — observa Mesquita. — Não tem um bairro no Brasil com esse serviço dessa qualidade, como o do VLT.
O crescimento da demanda no modal no primeiro semestre de 2025 influenciou, inclusive, um aumento no número de passageiros do sistema de transportes sobre trilhos do Rio como um todo, apontou o estudo da ANPTrilhos, que mapeou sistemas em 11 estados e no Distrito Federal. No caso fluminense, entram na conta o VLT, o metrô e os trens urbanos. Juntos, os três meios de transporte tiveram no primeiro semestre deste ano 161,2 milhões de usuários, 1% a mais que os 159,6 milhões do mesmo período do ano anterior. O resultado coloca o Rio como quinto estado, entre os mapeados, com maior aumento percentual de demanda, atrás do Piauí (51,2%), do Rio Grande do Sul (4%), de Alagoas (3,2%) e da Bahia (2,5%).
Os números do VLT no Rio motivam comemorações. Mas, nacionalmente, os dados mostram que são necessários mais investimentos.
— Até hoje não conseguimos retornar ao nível (de demanda) que a gente tinha antes da pandemia, no Rio, no Brasil e nos Estados Unidos. Na Europa, houve incentivo muito grande, através de subsídios, para que as pessoas voltassem a usar o transporte público. Então, a gente tem que comemorar esse aumento de passageiros (no VLT) — observa Joubert Flores, presidente do conselho administrativo da ANPTrilhos.
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Terminal Gentileza é apontado como protagonista no aumento da demanda do VLT
Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
Expansão do metrô
No Rio, o relatório da ANPTrilhos menciona ainda a articulação em prol da expansão do metrô, assim como a conclusão da estação Gávea do metrô como principais anúncios para o sistema sobre trilhos do Rio. Segundo a Secretaria estadual de Transporte e Mobilidade Urbana (Setram), a pasta atua junto à Riotrilhos no projeto de expansão previsto no Plano Diretor Metroviário, que inclui a ligação Estácio-Praça Quinze; a criação da Linha 3 (Praça Quinze—Niterói—Guaxindiba), que vai receber R$ 20 milhões do Ministério das Cidades para a fase de estudos; e a extensão da Linha 4 da Barra da Tijuca até o Recreio.
A pasta estadual diz ainda, sobre a SuperVia, que está próxima de entregar a operação dos trens ao governo, que um grupo de trabalho atua “de forma articulada com órgãos técnicos da administração pública e especialistas do setor ferroviário, desenvolvendo ações estratégicas”. Já sobre a integração dos modais estaduais com os modais municipais da capital, a Setram “informa que está em tratativa para a implementação da nova bilhetagem adotada pela Prefeitura do Rio em transportes estaduais”.
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